Rico?! Só se for de conhecimento
Não existe nada mais
irritante no mundo, para mim, do que quando retorno de uma viagem, quando posto
uma foto das minhas férias em minha conta no Instagram ou quando digo que meus
sapatos foram comprados em um bazar na Romênia e que meu anel foi um presente
do povo núbio de quando estive no Egito ou ainda que já morei no exterior e ter
que me deparar com amigos, familiares, colegas de trabalho, conhecidos e
desconhecidos, tecendo comentários desagradáveis, como: “Tá rico, hein!”,
“Queria ter essa sorte”, “Nossa como você é CHIC!”.
Minha vontade primária é de mandar todos à
merda, mas infelizmente como as leis da moral e dos bons costumes e minha
educação não me permitem, eu apenas dou um meio sorriso e lanço um olhar
fuzilante. Muitas vezes tenho vontade de entregar panfletos para quem me diz
uma barbaridade desta, dizendo:
“RICO!?
Só se for de conhecimento. Ah! e também
não sou esnobe, não tenho família rica e nem um padrinho político, muito menos
sou sócio de uma agência de turismo, e também não dei o “golpe do baú” e ainda
não ganhei na loteria. Sou uma pessoa normal, tenho diversas contas batendo à
minha porta todos os meses, tenho uma casa para sustentar e trabalho muito,
muito mesmo, às vezes até demais.”
Recordo-me que assim
que retornei de uma das minhas andanças pelo mundo um amigo me disse: “Nossa!
Mais de onde você tira tanto dinheiro para viajar? Cada vez que olho a linha do
tempo do meu Facebook você fez check-in
em uma cidade nova ou postou uma “selfie” com um monumento diferente. Você tem
tanta sorte! Queria ser assim como você: uma folha ao vento, mas um dia chego
lá”.
Pare aí... Sorte? Da
mesma forma que eu fui criado ele também foi, nos formamos na mesma instituição
e temos empregos similares com praticamente a mesma base salarial. Então o que
nos diferencia? Talvez a altura ou a cor dos olhos, sei lá... Só sei que fiquei
muito revoltado com aquelas palavras e comecei a analisar e quiçá até comparar
a minha vida com a dele.
Bom, ele tem a última
tecnologia no que se refere à telefonia móvel, o carro do ano e vive em
festinhas pela cidade. Já eu não tenho carro e tenho um celular de duas
gerações a menos e prefiro assistir filmes em casa ao invés de sair.
Como diria Cecília
Meireles: “Ou guardo o dinheiro e não compro o doce ou compro o doce e gasto o
dinheiro”, ou seja, tudo depende do que julgamos ser de primazia para nossas
vidas, o que nos faz feliz.
Eu não julgo ninguém
por gastar 300 reais em uma calça jeans, se isso lhes faz feliz, vá em frente,
compre, entretanto na minha realidade, no meu universo, eu prefiro gastar esta
mesma quantia em uma ou duas noites extras de acomodação em Budapeste, por
exemplo. Volto a afirmar que tudo é questão de prioridade.
Sei que não sou
obrigado a dar explicações sobre minhas escolhas e metas para ninguém, mesmo
porque já sou adulto e pago minhas contas. Mas quero deixar claro que sou
assalariado, tenho 30 dias de férias, feriados e fins-de-semana, assim como a
maioria. Minhas viagens vão muito além do dinheiro, elas começam com muito
planejamento, decisões e inúmeras abdicações.
Só posso afirmar que
não escrevi minha biografia desta forma para causar inveja ou desconforto em
ninguém, mas sim para uma satisfação pessoal.
Não acho que sou arrogante porque faço uma
viagem ao exterior todos os anos desde que comecei a trabalhar, de vez
enquanto, duas ou três vezes dependendo da minha disponibilidade e, obviamente,
do dinheiro. Ou ainda que seja esnobe por decorar meu apartamento com artigos
comprados aqui e ali. Não sou melhor do que ninguém por rodar o mundo
conhecendo outras culturas, falando outros idiomas e por ter amigos em inúmeros
países.
Volto a afirmar que
esse tipo de escolha só me deixou mais rico em experiência de vida, com elas
aprendi a ser independente, amadureci e passei a valorizar aspectos dos quais
não dava a mínima importância.
Minha família não pôde
me oferecer nada além do essencial, estudo, alimentação e amor. Então, da
próxima vez em que você ver uma fotografia minha nas redes sociais, por favor,
não aponte o dedo e diga: “Não disse é rico”, porque desta vez você ouvirá...
Bom, você já sabe, né!?
POR: VICTOR GALE